Finalmente vai chegar ao fim a terceira parte de um dos mais duros capítulos da minha vida - a minha primeira estadia no Outão (ainda fiz lá mais quatro cirurgias ao pé direito). Quem nasce torto…
As cirurgias foram um sucesso e foi a primeira intervenção em que implementaram um método novo. Tudo o que envolveu o processo cirúrgico e a minha recuperação foi registado em fotografia e foi passado em slide em vários congressos.
Um dos maiores sustos que vivi naquelas três semanas foi quando comecei a perder sangue pelas fezes e não se descobria a razão. Comecei a ficar debilitada, com anemia, tive de colocar uma sonda e a meu lado esteve o Dr. Benjamim que só me largou quando estava livre de perigo. Nesse dia havia a hipótese de ter de ser transferida para o Hospital de S. Bernardo e os meus pais não me queriam deixar por nada. Mas não podiam mesmo lá ficar. Esse médico-anjo disse para irem que passaria a noite comigo e assim foi. O meu pai não aguentava estar em casa com tanto nervosismo e ansiedade e resolveu de madrugada pôr-se a caminho do Outão. O Dr. Benjamim lá veio cá fora fumar um cigarro com ele e tranquiliza-lo.
No dia seguinte descobriu-se que tinha feito uma úlcera de stress e que era essa a causa das perdas de sangue. O meu anjo de nome Benjamim (era uma pessoa tão boa que se transformou em estrelinha cedo demais!!) no dia a seguir levou até mim uma das suas filhas e disse: "Vês filha foi por causa desta menina que o pai ontem não dormiu em casa".
No meio de todo este turbilhão eu lá ia conseguindo manter-me confiante: queria muito ser como as outras jovens!
Outro dia difícil que nunca me saiu da minha memória foi quando ao ter de reaprender a andar, uma fisioterapeuta decidiu levar-me até à praia. Subir aquela escadaria foi terrível: a cada degrau que subia, um lágrima caia…
As minhas companheiras de quarto foram muito importantes e um grande pilar. A Ana e a Filipa ficaram amigas para a vida. Conseguíamos no meio daquele turbilhão de dor e de sentimentos dispares encontrar momentos para descomprimir, sempre aleados ao teatro. Fizemos com cada sessão noturna!
A enfermeira Nazaré, a enfermeira Inácia, a enfermeira Guida e o fisioterapeuta Manel foram pessoas que muito contribuíram para tornar os dias menos difíceis.
Saí do hospital com uma roupa nova e que detestei usar: um colete de gesso que tive de usar durante nove meses. Foi duro, muito duro. A certa altura até tiveram de me fazer uma abertura na zona da barriga por ficar muito mal disposta quando comia. Ninguém imagina o que é dormir com um colete daqueles...
Felizmente que com o avanço da medicina quem faz esta cirurgia coloca um colete que pode tirar nalgumas alturas do dia.
Quando regressei para a casa tinha o meu quarto transformado em enfermaria, mas foi tão bom estar de volta!!
Hoje conto esta história com ligeireza mas só eu sei o quanto ela marcou a minha personalidade e forma de encarar a vida.